terça-feira, 13 de novembro de 2018

Um íssimo, íssimo cansaço

O que levará alguém a destruir a vida por causa da adição?
O que te fará continuar "agarrado" mesmo depois de perder tudo e todos?
Que força é essa a do vício?

Tenho tanta dificuldade em responder a estas perguntas.
O jogo levou-me o melhor amigo, o álcool teima em querer levar-me o padrinho que também é tio.
Dizia-me ontem que sou o mais próximo que tem de uma filha, ele que não vê, nem ouve a dele há anos. Demasiados. Na realidade, é ele o meu filho.

O universo levou muito a sério as minhas palavras de querer adoptar um rapazolas jeitoso que já soubesse ler e escrever. Tinha uma coisa voluptuosa em mente, nunca pensei que o cosmos conspirasse para me tornar cuidadora de um alcoólico em fase terminal.

Já esteve internado 4 vezes em processos de desintoxicação.
Todos falharam. Agora falhou ele. Falhou o fígado. Falharam os rins.
A minha avó encontrou-o caído, pensou-o morto.
Nenhuma mãe, em caso algum, devia passar por isto.

Já está há algum tempo sóbrio. A neuropatia não o deixa sair da cama e vá-se lá saber porquê ninguém ousou dar-lhe vinho sequer a cheirar. Os primeiros dias foram muito difíceis, o delírio, a iminência da morte, a minha pobre avó desfeita.
Agora está mais bem-disposto, no meio daquele caco humano já se ouvem risos. Aquele olhar ilumina-se quando me vê.

E eu sinto-me horrível por tantas vezes achar que é um "fardo" demasiado pesado. Choro baixinho quando o sono não vem ou dou um salto até à praia para poder exorcizar fantasmas à vontade.
Perdi-te João. Não pude fazer nada.
Estou a perder-te Manuel. Não vou desistir de ti.

Luto, desesperada, como uma condenada para o salvar. Sabendo porém que se ele sobreviver a isto, posso perdê-lo para uma garrafa. É muito cruel. É muito cruel para ele que é um docinho quando está sóbrio.

Sou agora madrinha de um pequeno amor, espero ser tão boa quanto o meu padrinho o foi para mim.
Não se preocupem com os meus antecedentes, não toco em álcool, o meu afilhado pode estar descansado :)

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